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quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Nos Extremos é que Está a Sabedoria...


Pode-se dizer que, muito plausivelmente,

há uma ignorância abecedária que precede o

saber e uma outra, doutoral, que se lhe segue,

ignorância esta que o saber produz e engendra

da mesma maneira que desfaz e destrói aqueloutra.

Dos espíritos simples, menos curiosos e menos instruídos,

fazem-se bons cristãos, que, por reverência e obediência,

com simplicidade, crêem e mantêm-se submissos às leis.

É nos espíritos de vigor e capacidade médios que se

engendram as opiniões erróneas, pois eles seguem a

aparência das suas primeiras impressões e têm pretextos

para interpretar como simpleza e estultícia o nosso apego

aos antigos usos, considerando que nós aí não chegámos

por via do estudo dessas matérias.


Os grandes espíritos, mais avisados e clarividentes,

constituem um outro género de bons crentes: por meio

de uma aturada e escrupulosa investigação, penetram

nas Escrituras até atingir uma luz mais profunda e abstrusa,

e entendem o misterioso e divino segredo da nossa política

eclesiástica.

Vemos, porém, alguns, com maravilhoso proveito e com

consolidação da sua fé, chegarem, através do segundo,

a este último nível, como o extremo limite da inteligência

cristã, e rejubilar na sua vitória com refrigério, acções de

graças, reformas dos costumes e grande modéstia.

Não entendo nesta categoria situar aqueloutros que, para

se purgarem da suspeita dos seus passados erros e para

ganharem a nossa confiança, tornam-se extremistas, insensatos

e injutos defensores da nossa causa, a qual maculam com infindos

e repreensíveis actos de violência.


Os camponeses simples são gente honesta e gente honesta

são os filósofos, ou seja, aqueles que, tanto quanto o permitem

os nossos tempos, possuem naturezas fortes e ilustres, enriquecidas

de um grande cabedal de conhecimentos úteis.

Os «mestiços», que desdenharam o primeiro estado -

o da ignorância das letras - e não conseguiram atingir o outro,

estando o seu cu entre duas selas (e no seu número eu, com

tantos outros, me incluo), são perigosos, ineptos e importunos:

são eles que trazem transtorno ao mundo.

Por isso, no que me diz respeito, recuo tanto quanto posso para

esse primeiro estado natural, do qual em vão tentei me afastar.

A poesia popular, puramente espontânea, tem encantos e graças

pelas quais se compara à beleza superior da poesia artisticamente

perfeita, como se vê nos vilancicos gascões e nas canções que nos

foram trazidas de nações sem conheciemnto de nenhuma ciência e

nem mesmo da escrita.

A poesia mediana, que se situa entre essas duas, é desprezível e

indigna de ser honrada e apreciada.


(...) se estes ensaios fossem dignos de serem reflectidos, poderia

ocorrer, em minha opinião, que eles não agradassem aos espíritos

comuns e vulgares, nem tão-pouco aos singulares e excelentes -

aqueles não os entenderiam suficientemente, estes, entendê-los-iam

bem de mais - e só poderiam sobreviver na região intermédia...
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Michel de Montaigne...

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