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domingo, 7 de outubro de 2012

Adeus, Lisboa...


Vou-me até à Outra Banda

no barquinho da carreira.

Faz que anda mas não anda;

parece de brincadeira.

Planta-se o homem no leme.

Tudo ginga, range e treme.

Bufa o vapor na caldeira.

Um menino solta um grito;

assustou-se com o apito

do barquinho da carreira.

Todo ancho, tremelica

como um boneco de corda.

Nem sei se vai ou se fica.

Só se vê que tremelica

e oscila de borda a borda.


Chapas de sol, coruscantes

como lâminas de espadas,

fendem as águas rolantes

esparrinhando flamejantes

lantejoulas nacaradas.

Sob o dourado chuveiro,

o barquinho terno e mole,

vai-se afastando, ronceiro,

na peugada do Sol.


A cada volta das pás

moendo as águas vizinhas,

nos remoinhos que faz,

nos salpicos que me traz

e me enchem de camarinhas,

há fagulhas rutilantes,

esquírolas de marcassites,

polimentos de pirites,

clivagens de diamantes,


Numa hipnose coletiva,

como um friso de embruxados,

ao longe os olhos cravados

em transe de expectativa,

todos juntos, na amurada,

numa sonolência de ópio,

vemos, na tarde pasmada,

Lisboa televisada

num vasto cinemascópio.

O sol e a água conspiram

num conluio de beleza,

de elixires que se evadiram

de feiticeira represa.

Fulva, no céu incendido,

em compostura de pose,

a cidade é colorido

cenário de apoteose.

Há lencinhos agitados

nos olhos de todos nós,

engulhos de namorados,

embargamentos na voz.

Nesta quermesse do ar,

neste festival de tons,

quem se atreve a acreditar

que os homens não sejam bons?


Adeus, adeus, ribeirinha

cidade dos calafates,

rosicler de água-marinha,

pedra de muitos quilates.

Iça as velas, marinheiro,

com destino a Calecu.

Oh que ventinho rasteiro!

Que mar tão cheio e tão nu!

Ó da gávea! Põe-te alerta!

Tem tento nos areais.

Cá vou eu à descoberta

das índias Orientais.

Não tenho medo de nada,

receio de coisa nenhuma.


A vida é leve e arrendada

como esta réstea de espuma.

Toda a gente é séria e é boa!

Não existem homens maus!

Adeus, Tejo! Adeus Lisboa!

Adeus, Ribeira das Naus!

Adeus! Adeus! Adeus! Adeus!...
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António Gedeão...

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