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terça-feira, 25 de setembro de 2012
Como amo meu país...
Fragmento 1
Com aquela melancolia que ao entardecer
em Teresina
eu olhava do outro lado do sujo rio
a vilazinha de Timon,
com a fúria da multidão endomingada martelando
caranguejos entre farofa e cerveja
numa praia em Aracaju,
com a penintência de quem amssa o barro
que depois vira anjo nas mãos das mulheres de
Tracunhaém, com a solidez marinha do jangadeiro
em Cabedelo
empurrando a esperança mar adentro
e a repartir a espinha do dia morto sobre a areia,
com a cadência magoada do vaqueiro tangido nos
seus cornos a recolher o sal e a solidão
nos currais de Minas, em Curvelo, assim
eu amo este país que me desama.
Fragmento 2
Deveria deixar de amá-lo como sub ser vivo
e amá-lo ostensivo
num tropel de bandeiras
num estádio de urros
e canções guerreiras?
Amo este país
como o hortelão cuida e corta
a praga de sua horta
e parte com seu cesto a bater de porta em
porta
com a resignação do operário
abraçado à neblina da marmita,
quando larga os panos e a mulher na madrugada
e sai do café quente de sua casa
e desce nos vagões de medo ao fundo da espúria
mina.
Fragmento 3
Deve haver quem ame o seu país
como quem escarra em casa própria,
coça o saco na calçada,
arrota e palita os dentes,
entorna cachaça ao santo
suando a alma e o corpo
no ébrio espasmo do gol.
Uns amam seu país
como o mendigo o seu muro,
como o agiota o seu juro. Outros
como o domador às suas feras:
- distância e precisão -
para evitar que o povo
- lhe arranque o poder da mão.
Outros amam seu país
como o carcereiro a prisão,
o lenhador a floresta
e o carvoeiro o carvão.
Há quem o ame no palco e pista
sem máscaras, expondo as vísceras,
e há quem o ame sonolento
num camarote ou nas frisas
enquanto o catnro, o cavalo e o jogador
se atropelam numa ópera surrealista.
Há quem o ame com o cáutico e sádico amor
com que o gigolô deprava e surra a cansada
mulher das madrugadas ou quem o ame
como a própria mulher
furando seus cartões ao som do sexo
aviltado no metal da orquestra.
Fragmento 4
Eu, quando posso,
ponho minha alma num carro de bebê
e vou levá-la ao sol da praça. Praça
que ninguém mais conheceu
que Felipe dos Santos atado
à cauda do cavalo, cimentando o chão
com o repasto de seu sangue.
Fora isto
com a passividade estrangulada do índio
carregando as armas do invasor
tenho a ingenuidade e o desperdiçado amor
dos Kreen-Akarores em suas matas
quando viram os berloques e espelhos
trazidos
pelos irmãos Vilas-Boas
do outro lado do rio,
Desde então
eu amo este país
- como a prostituta ama a estrada...
.
.
.
Afonso Romano de Sant'Anna...
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