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sexta-feira, 28 de setembro de 2012
Abstração e amor...
Aproxima-te de mim, dá-me as mãos delicadas
E descansa a cabeça em meu ombro.
É melhor que não desnastres os cabelos,
Os louros, finos e obedientes cabelos
- Essa parte dignificada do teu corpo,
A que melhor resistirá à morte.
Hesito entre o lado diurno e noturno do teu ser.
Aos olhos do homem tu és apenas decorativa,
Mas eu pressinto claramente em ti
A que tem o pudor da sua profundidade,
A que espera a anunciação dum forte drama
Que dividirá a vida como espada de dois gumes.
Talvez seja mais belo e favorável à poesia
Que nunca te manifestes totalmente a mim
E que continuemos a nos ver na obscuridade
Para que eu, guardando a eterna nostalgia de ti,
Jamais possa me sentir saciado.
Todos são fascinados pela tua vida visível,
Pela tua aparente suavidade.
Todos são fascinados pelo teu nome:
E ninguém conhece teu verdadeiro nome.
Há entre mim e ti zonas de sombra
Contornadas por anjos divinatórios.
Há entre mim e ti o mínimo necessário
Para assegurar tua invisibilidade.
Existes telefonicamente para mim.
Às vezes não consigo te tornar bastante obscura
E me traio, pedindo tua presença.
Quanto mais longe de ti mais te desejo
E te sinto mais branca e invulnerável.
Ainda não és um mito, ainda não estás
Fixada na invisível realidade...
.
.
.
Murilo Mendes...
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