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terça-feira, 14 de agosto de 2012

Descoberta da Literatura...


No dia-a-dia do engenho,


toda a semana, durante,

cochichavam-me em segredo:

saiu um novo romance.

E da feira do domingo

me traziam conspirantes

para que os lesse e explicasse

um romance de barbante.

Sentados na roda morta

de um carro de boi, sem jante,

ouviam o folheto guenzo ,

a seu leitor semelhante,

com as peripécias de espanto

preditas pelos feirantes.

Embora as coisas contadas

e todo o mirabolante,

em nada ou pouco variassem

nos crimes, no amor, nos lances,

e soassem como sabidas

de outros folhetos migrantes,

a tensão era tão densa,

subia tão alarmante,

que o leitor que lia aquilo

como puro alto-falante,

e, sem querer, imantara

todos ali, circunstantes,

receava que confundissem

o de perto com o distante,

o ali com o espaço mágico,

seu franzino com o gigante,

e que o acabassem tomando

pelo autor imaginante

ou tivesse que afrontar

as brabezas do brigante.


(E acabaria, não fossem

contar tudo à Casa-grande:

na moita morta do engenho,

um filho-engenho, perante

cassacos do eito e de tudo,

se estava dando ao desplante

de ler letra analfabeta

de curumba, no caçanje

próprio dos cegos de feira,

muitas vezes meliantes)...
.
.
.
João Cabral de Melo Neto...

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