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segunda-feira, 23 de julho de 2012

Três presentes de fim de ano...



I


Querida, mando-te

uma tartaruguinha de presente

e principalmente de futuro

pois viverá uma riqueza de anos

e quando eu haja tomado a estígia barca

rumo ao país obscuro

ela te me lembrará no chão do quarto

e te dirá em sua muda língua

que o tempo, o tempo é simples ruga

na carapaça, não no fundo amor.



II


Nem corbeilles nem

letras de câmbio

nem rondós nem

carrão 69

nem festivais

na ilha d’amores

não esperes de mim

terrestres primores.

Dou-te a senha para

o dom imperceptível

que não vem do próximo

não se guarda em cofre

não pesa, não passa

nem sequer tem nome.

Inventa-o se puderes

com fervor e graça.



III


Sempre foi difícil

ah como era difícil escolher

um par de sapatos, um perfume.

Agora então, amor, é impossível.

O mau gosto

e o bom se acasalaram, catrapuz!

Você acha mesmo bacana esse verniz abóbora

ou tem medo de dizer que é medonho?

E aquele quadro (objeto)? aquela pantalona?

Aquela poesia? Hem? O quê? não ouço

a sua voz entre alto-falantes, não distingo

nenhuma voz nos sons vociferantes...

Desculpe, amor, se meu presente

é meio louco e bobo

e superado:

uns lábios em silêncio

(a música mental)

e uns olhos em recesso

(a infinita paisagem)...
.
.
.
Carlos Drummond de Andrade...

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