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quinta-feira, 26 de julho de 2012

Aparição amorosa...


Doce fantasma, por que me visitas

como em outros tempos nossos corpos se visitavam?

Tua transparência roça-me a pele, convida

a refazermos carícias impraticáveis: ninguém nunca

um beijo recebeu de rosto consumido.


Mas insistes, doçura. Ouço-te a voz,

mesma voz, mesmo timbre,

mesmas leves sílabas,

e aquele mesmo longo arquejo

em que te esvaías de prazer,

e nosso final descanso de camurça.


Então, convicto,

ouço teu nome, única parte de ti que não se dissolve

e continua existindo, puro som.

Aperto... o quê? a massa de ar em que te converteste

e beijo, beijo intensamente o nada.

Amado ser destruído, por que voltas

e és tão real assim tão ilusório?

Já nem distingo mais se és sombra

ou sombra sempre foste, e nossa história

invenção de livro soletrado

sob pestanas sonolentas.

Terei um dia conhecido

teu vero corpo como hoje o sei

de enlaçar o vapor como se enlaça

uma idéia platônica no espaço?


O desejo perdura em ti que já não és,

querida ausente, a perseguir-me, suave?

Nunca pensei que os mortos

o mesmo ardor tivessem de outros dias

e no-lo transmitissem com chupadas

de fogo aceso e gelo matizados.


Tua visita ardente me consola.

Tua visita ardente me desola.

Tua visita, apenas uma esmola...
.
.
.
Carlos Drummond de Andrade...

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