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terça-feira, 27 de março de 2012

A solidão dos homens tem a medida da solidão de suas mulheres...


Isso eu disse e escrevi - e repito - em dezenas de
palestras por este país afora.



Aí me pedem para escrever sobre o casal perfeito:
bom para quem gosta de desafios.

O casal perfeito seria o que sabe aceitar a solidão inevitável
do ser humano, sem se sentir isolado do parceiro - ou sem se isolar dele?



O casal perfeito seria o que entende aceita, mas não se conforma,
 com o desgaste de qualquer convívio e qualquer união?

Talvez se possa começar por aí: não correr para o casamento,
o namoro, o amante ,não importa ,imaginando que agora serão
solucionados ou suavizados todos os problemas - a chatice da
casa dos pais, as amigas ou amigos casando e tendo filhos, a
mesmice do emprego, chegar sozinha às festas e sexo difícil e sem afeto.

Não cair nos braços do outro como quem cai na armadilha
do ‘enfim nunca mais só!’, porque aí é que a coisa começa a ferver.

Conviver é enfrentar o pior dos inimigos, o insidioso, o silencioso, o
sempre à espreita, o incansável: o tédio, o desencanto, esse inimigo
de dois rostos.

Passada a primeira fase de paixão (desculpem, mas ela passa,
o que não significa tédio nem fim de tesão ) , a gente começa
a amar de outro jeito.

Ou a amar melhor; ou, aí é que a gente começa a amar.

A querer bem; a apreciar; a respeitar; a valorizar; a mimar;
a sentir falta; a conceder espaço; a querer que o outro cresça
e não fique grudado na gente.

O cotidiano baixa sobre qualquer relação e qualquer vida,
com a poeira do desencanto e do cansaço, do tédio.

A conta a pagar, a empregada que não veio, o filho doente, a filha
complicada, a mãe com Alzheimer, o pai deprimido ou simplesmente
o emprego sem graça e o patrão de mau humor.

E a gente explode e quer matar e morrer, quando cai aquela
 última gota - pode ser uma trivialíssima gota - e nos damos
conta: nada mais é como era no começo. Nada foi como eu esperava.

Não sei se quero continuar assim, mas também não sei o que fazer.

Como a gente não desiste fácil, porque afinal somos guerreiros ou
nem estaríamos mais aqui, e também porque há os filhos, os compromissos,
a casa, a grana e até ainda o afeto, é preciso inventar um jeito de recomeçar, reconstruir.

Na verdade devia-se reconstruir todos os dias.

Usar da criatividade numa relação.

O problema é que, quando se fala em criatividade numa relação, a maioria
pensa logo em inovações no sexo, mas transar é o resultado, não o meio.

Um amigo disse no aniversário de sua mulher uma das coisas mais belas
que ouvi: ‘Todos os dias de nosso casamento (de uns 40 anos), eu te
escolhi de novo como minha mulher’.

Mas primeiro teríamos de nos escolher a nós mesmos diariamente.

Ao menos de vez em quando sentar na cama ao acordar, pensar:
como anda a minha vida? Quero continuar vivendo assim?
Se não quero, o que posso fazer para melhorar?

 Quase sempre há coisas a melhorar, e quase sempre podem ser melhoradas.

Ainda que seja algo bem simples; ainda que seja mais complicado,
como realizar o velho sonho de estudar, de abrir uma loja, de fazer
uma viagem, de mudar de profissão.

Nós nos permitimos muito pouco em matéria de felicidade, alegria,
realização e sobre tudo abertura com o outro.

Velhos casais solitários ou jovens casais solitários dentro de casa
são terrivelmente tristes e terrivelmente comuns.

É difícil? É difícil. É duro? É duro.

Cada dia, levantar e escovar os dentes já são atos heróicos, dizia Hélio Pellegrino.

Viver é um heroísmo, viver bem um amor mais ainda.

“O casal perfeito talvez seja aquele que não desiste de correr atrás do
sonho de que, apesar dos pesares, a gente, a cada dia, se escolheria novamente, e Amém”...
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Lya Luft...

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