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domingo, 16 de setembro de 2012

Quem sou eu?...


Quem sou eu dentro da minha boca?

Quem sou eu nos meus dentes

detrás dos meus dentes

na língua que se move

presa no fundo da garganta? que nome tenho

na escuridão do esôfago?

no estômago

na química dos intestinos?


Quem em mim secreta

saliva? excreta

fezes?

quem embranquece em meus cabelos

e vira pus nas gengivas?

Quem sou eu

ao lado da Biblioteca Nacional

tão frágil, meu deus, na noite

sob as estrelas?

e no entanto impávido!

(a mexer no armário de roupas

num apartamento da rua Tenente Possolo

em 1952

vivo a história do homem).


J’irai sous la aterre

et toi, tu marcheras dans le soleil.


Tudo o que sobrará de mim

é papel impresso.


Com um pouco de manhã

engastado nas sílabas, é certo, mas

que é isso

em comparação com meu corpo real? meu

corpo

onde a alegria é possível

se mãos lhe tocam os pêlos

se uma boca o beija

o saliva

o chupa com dois olhos brilhantes?


E sou então

praia vento floresta

resposta sem pergunta

o eixo do corpo

na saliva dourada

giro

e giramos

com o verão que se estende por todo o hemisfério sul


Como dizer então: pouco

me importa a morte?

E sobretudo se existem as histórias em quadrinhos

e os programas de televisão

que continuarão a passar noite após noite

no recesso dos lares

numa terça-feira que antecede à quarta

numa quinta-feira que antecede à sexta

ou num sábado

ou num domingo.

Como dizer

pouco me importa?...
.
.
.
Ferreira Gullar...

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