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segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Menor abandonado...


Versos amargos para o

Ano Internacional da Criança, 1979.


De onde vens, criança?

Que mensagem trazes de futuro?

Por que tão cedo esse batismo impuro

que mudou teu nome?


Em que galpão, casebre, invasão, favela,

ficou esquecida tua mãe?...

E teu pai, em que selva escura

se perdeu, perdendo o caminho

do barraco humilde?...


Criança periférica rejeitada...

Teu mundo é um submundo.

Mão nenhuma te valeu na derrapada.


Ao acaso das ruas – nosso encontro.

És tão pequeno... e eu tenho medo.

Medo de você crescer, ser homem.

Medo da espada de teus olhos...

Medo da tua rebeldia antecipada.

Nego a esmola que me pedes.

Culpa-me tua indigência inconsciente.

Revolta-me tua infância desvalida.


Quisera escrever versos de fogo,

e sou mesquinha.

Pudesse eu te ajudar, criança-estigma.

Defender tua causa, cortar tua raiz

chagada...


És o lema sombrio de uma bandeira

que levanto,

pedindo para ti – Menor Abandonado,

Escolas de Artesanato – Mater et Magistra

que possam te salvar, deter a tua queda...


Ninguém comigo na floresta escura...

E o meu grito impotente se perde

na acústica indiferente das cidades.


Escolas de Artesanato para reduzir

o gigantismo enfermo

da criança enferma

é o meu perdido s.o.s.


Estou sozinha na floresta escura

e o meu apelo se perdeu inútil

na acústica insensível da cidade.

És o infante de um terceiro mundo

em lenta rotação para o encontro

do futuro.


Há um fosso de separação

entre três mundos.

E tu – Menor Abandonado,

és a pedra, o entulho e o aterro

desse fosso.


Quisera a tempo te alcançar,

mudar teu rumo.

De novo te vestir a veste branca

de um novo catecúmeno.

És tanto e tantos teus irmãos

na selva densa...


E eu sozinha na cidade imensa!

“Escolas de ofícios Mãe e Mestra”

para tua legião.

Mãe para o amor.

Mestra para o ensino.


Passa, criança... Segue o teu destino.

Além é o teu encontro.

Estarás sentado, curvado, taciturno.

Sete “homens bons” te julgarão.

Um juiz togado dirá textos de Lei

que nunca entenderás.


- Mais uma vez mudarás de nome.

E dentro de uma casa muito grande

e muito triste – serás um número.


E continuará vertendo inexorável

a fonte poluída de onde vens.


Errante, cansado de vagar,

dormirás como um rafeiro

enrodilhado, vagabundo, clandestino

na sombra das cidades

que crescem sem parar.


Há um fosso entre três mundos.

E tu, Menor Abandonado,

és o entulho, as rebarbas e o aterro

desse fosso.


Acorda, Criança,

hoje é o teu dia... Olha, vê como brilha lá longe,

na manchete vibrante dos jornais,

na consciência heróica dos juízes,

no cartaz luminoso da cidade,

o ano internacional da criança....
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Cora Coralina...

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